segunda-feira, 5 de abril de 2010

Como será a nova lei da internet

Projeto de um marco legal para a rede foi enviado ao Ministério da Justiça três dias antes da troca de comando na pasta. E agora?

Agência Estado
Fábio Zelenski, 24 anos, trabalha com novas mídias, tem blog e usa a internet para divulgar sua banda. Frederico Pandolfo, de 25, é administrador de redes e está terminando a pós-graduação em segurança de sistemas computacionais. Além do interesse em web, os dois têm ou­­­­tra coisa em comum: podem ter ajudado a criar o Marco Civil da Internet, a lei brasileira que definirá os direitos e deveres dos cidadãos, provedores e do governo na web.

Zelenski e Pandolfo estão entre as pessoas que mais discutiram e enviaram contribuições nos 45 dias de consulta pública. O Marco Civil foi apresentado em outubro pelo Ministério da Justiça para ser um marco regulatório da internet, criado na própria internet e discutido pelos maiores interessados no assunto – os cidadãos. Na pauta da futura legislação estão temas espinhosos como a garantia de anonimato e a privacidade.

“Resolvi comentar porque é um assunto que envolve o que eu faço. Eu uso a internet para divulgar música e bandas, para conseguir livros, quadrinhos, softwares, para compartilhamento. E o marco vai interferir diretamente nisso”, diz Fábio Zelenski. A consulta pú­blica criada pelo governo em parceria com o Centro de Tec­­nologia e Sociedade da FGV-RJ recebeu 822 contribuições na forma de comentários, e-mails, tweets e citações em blogs. Tu­­do foi con­­densado e transformado em um anteprojeto apresentado ao ministro da Justiça, Tarso Genro, na sexta – três dias antes de ele deixar o cargo para candidatar-se a governador do Rio Grande do Sul.

“O ministro está empolgado com a ideia”, disse à reportagem o gestor do projeto, Paulo Rená, an­­tes que Genro deixasse o cargo. “A diferença dessa para as consultas públicas tradicionais é que as pessoas, ao entrar em contato com um órgão público, não sabem o que as outras estão falando. O ministro achou interessante o fato de os atores sociais conversarem entre si.” A dúvida, agora, é se o novo ministro, Luiz Paulo Barreto, dará andamento ao projeto com o mesmo entusiasmo.

Para transformar um calhamaço de 580 páginas de opiniões e comentários em um projeto de lei, o Ministério da Jus­­tiça diz que privilegiou a argumentação. “A decisão não le­­vou em conta o quantitativo, mas o argumento que consideramos me­­lhor dado o interesse inicial do marco, que é preservar as liberdades.”

Se a rede é um am­­bien­­te de liberdade, por­­que criar um marco re­­gula­tório? Porque hoje no Brasil não há legislação específica sobre o tema. Essa brecha abre espaço pa­­ra projetos como a Lei Azeredo (projeto que tornava crime o compartilhamento de arquivo) e ou­­tros mais es­­­drú­­xulos.

Os internautas ti­­veram interesse par­­ticular nos tópicos so­­bre privacidade, guarda de logs, li­­berdade de expressão e anonimato. Es­­ses tópicos con­­sumiram mais tem­­po do ad­­mi­­nistra­dor de re­­des Fre­­derico Pandol­­fo. Quan­­do ou­­viu falar do marco civil, ele nem pen­­sava em co­­laborar – mas achou “al­­guns itens absurdos”. Ele foi a pessoa que mais en­­viou colaborações para o Marco Civil. “Re­­solvi fazer meu papel de cidadão e lutar para manter o sagrado direito de pensar, me expressar e navegar livremente”, disse. Pan­­dolfo é defensor do anonimato e não fugiu das brigas. Sim, como em todo fórum, não fal­­taram de­­bates acalorados.

Essa foi uma das intenções do Ministério da Justiça, diz Paulo Rená. “Se não há polêmica, a pessoa só lê o texto e pensa ‘ok, concordo’”. Nas discussões, não houve moderação prévia – embora houvesse demanda para isso. No tópico sobre liberdade de expressão, um comentário tinha um palavrão. Outro reclamou: ‘não há moderação aqui, não?’. E um terceiro interveio, lembrando que o tema do tópico era a liberdade e, portanto, não fazia sentido manifestações de repressão.

O advogado Alexandre Athe­niense conta que trabalhou com o tema com seus alunos na pós-graduação de Direito de Informática, mas reclama do prazo de consulta. “Foi complicado chegar às conclusões”, diz. Para ele, a iniciativa foi válida, mas ainda não é o ideal. “Teve o lado bom que motivou parte da sociedade a debater um tema que até então não havia sido amplamente discutido. O nível foi bom”, diz ele, que assinou a contribuição enviada pelo Conselho Federal da OAB.

Fonte: Gazeta do Povo

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