terça-feira, 21 de abril de 2009

Web força jornais a rever modelos digitais

Grandes jornais brasileiros entram no debate sobre a cobrança ou gratuidade do acesso aos seus conteúdos na internet

Jonas Furtado
Uma adaptação capitalista para a mais filosófica dúvida da
dramaturgia universal assola donos de jornais do mundo todo.
Cobrar ou não cobrar pelo acesso ao conteúdo de suas versões
digitais é a questão que insiste em não calar para grandes grupos
de mídia impressa. No epicentro do debate está a imprensa norteamericana,
cujos prejuízos vêm se intensificando com o
agravamento da crise econômica. Grandes companhias, como a
Time Inc. e o New York Times Co., estudam formas de serem
remuneradas pelo acesso a seus conteúdos na web.
Paralelamente, a Associated Press tem disparado verbalmente
contra os agregadores e buscadores de notícia, a quem acusa de
obter lucros à custa da apropriação indevida de conteúdo
produzido pelas empresas jornalísticas.
No Brasil, a discussão também já foi estabelecida, mas em
temperaturas mais amenas ? ao menos por enquanto. Desde o final
da década de 90 sobressaía a tendência, entre os jornais, de
apostar no livre acesso ao conteúdo digital para incrementar a
audiência online, gerando interesse dos anunciantes e ótimas
receitas publicitárias. "Como a publicidade no meio internet não
está consolidada, está acontecendo uma correção de rumo. A
grande maioria das empresas de agora entende que é importante
cobrar pelo conteúdo", diz Ricardo Pedreira, diretor executivo da
Associação Nacional de Jornais (ANJ).
O Grupo Estado, que publica o Estado de S. Paulo, já
experimentou praticamente todos os modelos, e hoje adota um
sistema misto ? há notícias exclusivas para assinantes, enquanto
parte do conteúdo é de acesso livre. O diretor de conteúdo do
grupo, Ricardo Gandour, acredita que o advento dos buscadores e
agregadores de notícias subverteu o modelo idealizado
anteriormente. "O agregador mudou essa dinâmica. Hoje, há
terceiros pegando conteúdo alheio e montando um negócio
próprio. Mas não se pode ignorar que esse conteúdo teve um custo
para ser produzido", diz.
Gandour defende que os meios geradores de informação estudem
urgentemente um modelo de negócio pago para a plataforma
digital, como condição essencial para a existência do jornalismo
de qualidade. "Eu vejo a sociedade valorizando a informação com
credibilidade, assim como assinam uma TV a cabo e pagam até por
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assinatura de água hoje em dia. O consumidor paga por
conveniência e confiabilidade", compara. "Mudar esse cenário
atual é um desafio importante porque, no fundo, estamos falando
de perpetuar marcas. E marcas se perpetuam com a sociedade
reconhecendo o valor do serviço oferecido."
Para o superintendente do Grupo Folha, Antonio Manuel Teixeira
Mendes, o modelo online vigente corre risco de um "travamento"
caso os provedores de conteúdo não sejam acomodados em um
sistema economicamente viável também para eles. "Há muitos
players ganhando dinheiro no universo digital, como as empresas
de telecom, tecnologia e plataformas", afirma. "Mas as pessoas
acessam a internet motivadas pelo que aparece na tela, e não
pelo que está por trás dela. Portanto, o que aparece na tela tem
de estar monetizado e ser devidamente remunerado."
Enquanto boa parte do conteúdo da Folha Online tem acesso livre,
as versões digitais das edições impressas da Folha de S. Paulo são
exclusivas para assinantes do jornal ou do provedor UOL. Esse
modelo é o mais interessante para os provedores de acesso,
segundo Guilherme Ribenboim, presidente do Internet Advertising
Bureau Brasil, entidade que regulamenta o uso dos meios
interativos de comunicação e marketing no País. "Cria um
conteúdo premium, fechado para assinantes, que agrega valor ao
negócio dos provedores. É um diferencial para conquistar
assinaturas", justifica. Ele não acredita, porém, em sistemas de
cobranças como o micropagamento, inspirado no comércio de
músicas online. O modelo, pelo qual o usuário pagaria
determinada quantia por notícia lida, é um dos mais aventados nos
debates do assunto. "Pela minha experiência com internet, não
vejo o mesmo modelo funcionando com notícias. São coisas muito
diferentes. Uma música é por definição um arquivo."
Cultura estabelecida
A opinião de Ribenboim é compartilhada por Marcelo Rech, diretor
de produto do Grupo RBS, que publica o Zero Hora e mais sete
jornais nos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. "Acho
pouco provável que um sistema de micropagamento funcione. Meu
feeling é que as pessoas não estão dispostas a pagar por nada na
internet. É uma cultura que se estabeleceu", analisa. A exceção
que faria o internauta mexer no bolso, para Rech, seria o acesso a
um conteúdo muito diferenciado. Essa é a fórmula do The Wall
Street Journal, que por muito tempo foi voz destoante no meio ao
cobrar pela leitura de suas notícias quando a tendência apontava
para o acesso gratuito.
Atualmente, o conteúdo dos jornais do Grupo RBS é oferecido
integralmente e com acesso livre na web, mas diferentes modelos
vêm sendo discutidos. A aposta para o futuro segue o pensamento
do presidente da empresa, Nelson Sirotsky, para quem a
informação será gratuita, e o jornalismo, pago. Rech explica. "A
informação hoje é uma commodity. Todo mundo tem ao mesmo
tempo. Se ofereço no jornal a mesma notícia 24 horas depois de
ver as fotos nos sites e as imagens na televisão, estou
desvalorizando meu produto. Alguns jornais ainda acham que
estão em 1970", critica. "O modelo de jornal impresso com que
trabalhamos é cada vez mais interpretativo, analítico, com visões
exclusivas e antecipando o que será relevante nos próximos dias.
Isso poderá ser cobrado, até mesmo na internet", completa.
AP VS Google
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O debate "conteúdo pago versus conteúdo grátis" esquentou de vez
nos últimos dias, quando o presidente do conselho da agência de
notícias Associated Press, Dean Singleton, elevou o tom de suas
declarações contra os agregadores de notícias, como o Google
News. Por meio de um release, a AP informou que irá ampliar a
proteção ao conteúdo produzido por seus jornais associados,
limitando e fiscalizando o seu uso em páginas online não
autorizadas. "Não podemos mais ficar parados assistindo a
terceiros se apropriarem do nosso trabalho sob pretextos legais
equivocados", disse Singleton no encontro anual da entidade. O
Google emitiu comunicado refutando ser o alvo direto da
declaração, "uma vez que dispõe dos artigos por meio de uma
parceria acertada com a AP", e esclarecendo que uma simples
solicitação basta para os jornais não terem seus textos publicados
no Google News.
No Brasil, com exceção da Folha de S. Paulo, os grandes jornais
permitem que o Google Notícias agregue seus conteúdos. Para
Ricardo Vezo, diretor de negócios da unidade O Globo, da
Infoglobo, é preciso analisar o caso sobre diferentes prismas. "Se,
por um lado, o Google captura parte importante da receita
publicitária dos sites produtores de conteúdo, por outro, responde
por parcela considerável do tráfego gerado para estes através de
suas ferramentas de buscas", pondera. "Nós optamos pelo caminho
da parceria", conclui. O acesso às notícias do site de O Globo é
gratuito, mas a versão em PDF

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