domingo, 29 de novembro de 2009

Ainda podemos salvar a Amazônia

Poderíamos eliminar 17% de todas as emissões, se pu­­déssemos interromper o des­­matamento e as queimadas nas florestas tropicais

Publicado em 22/11/2009 Thomas L. Friedman
Não importa quantas vezes nós as vemos: há estatísticas que simplesmente nos impressionam. A que sempre me deixa perplexo é esta: imagine se pe­­gássemos todos os carros, caminhões, aviões, trens e navios do mundo e acrescentássemos mais a poluição do escapamento de todos os anos. A quantidade de dióxido de carbono (CO2) que todos esses carros, caminhões, aviões, trens e navios emitem de forma coletiva na atmosfera é, na verdade, menor que as emissões de carbono anuais resultantes do corte e do desmatamento de florestas tropicais em lugares como Brasil, Indonésia e Congo. Perdemos uma floresta tropical do tamanho do estado de Nova Iorque a cada ano, e o carbono emitido na atmosfera hoje corresponde a aproximadamente 17% de todas as emissões globais que contribuem para as mudanças climáticas.

Vai levar muito tempo para transformar a frota mundial de transporte em uma frota livre de emissões. Porém, no momento – tipo, amanhã –, poderíamos eliminar 17% de todas as emissões, se pudéssemos interromper o desmatamento e as queimadas nas florestas tropicais. Mas, para isso, é necessário colocar em prática um novo sistema de desenvolvimento econômico – um que torne mais lucrativo para países pobres e com florestas preservar e gerenciar suas árvores, em vez de cortá-las para produzir móveis ou plantar soja. Sem um novo sistema para o de­­senvolvimento econômico nos trópicos ricos em madeira, podemos dizer adeus às florestas.

O antigo modelo de crescimento econômico vai devorá-las. A única “Amazon” que seus netos vão conhecer é aquela que termina com ponto-com e vende livros. Para melhor entender a questão, estou visitando a Flo­­resta Nacional do Tapajós no co­­ração da Amazônia brasileira, em uma viagem organizada pela Conservation International e o governo brasileiro. Ao voar para cá em avião de hélice a partir de Manaus, você consegue entender por que a floresta amazônica é considerada um dos pulmões do planeta.

Até a 6.100 metros, tudo que se vê, em todas as direções, é uma expansão contínua de copas de árvores que, vistas de cima, parecem um infinito tapete de brócolis. Quando chegamos em terra, fomos de carro de Santarém a Tapajós, onde nos reunimos com a cooperativa comunitária que gerencia negócios ecológicos aqui, responsáveis pelo sustento das 8 mil pessoas que vivem nesta floresta protegida.

O que se aprende quando vo­­cê visita uma pequenina comunidade brasileira que de fato vive da e na floresta é uma verdade simples, mas crucial: para salvar um ecossistema natural, é preciso um ecossistema de mercados e governança. “Precisamos de um novo modelo de desenvolvimento econômico – baseado em aumentar o padrão de vida das pessoas ao manter seu capital natural, não apenas convertendo aquele capital natural em criação de gado, agricultura industrial ou corte de madeira”, disse José Maria Silva, vice-presidente para a América do Sul da Conservation International. No momento, as pessoas que protegem a floresta recebem uma mi­­xaria – em comparação àqueles que a exploram –, embora saibamos que a floresta faz tudo, de manter o CO2 fora da atmosfera a manter o fluxo de água fresca nos rios. A boa notícia é que o Brasil tem posto em prática todos os elementos de um sistema para compensar os moradores da floresta por preservá-la. O Brasil já separou 43% da floresta amazônica para conservação e grupos indígenas. Entretanto, outros 19% da Amazônia já foram desflorestados por agricultores e fazendeiros. Assim, a grande questão é: o que vai acontecer com os outros 38%? Quanto mais o sistema brasileiro funcionar, mais desses 38% será preservado e menor será a redução de carbono que o mundo inteiro terá de empreender. Mas isso custa di­­nheiro. Os moradores da reserva Tapajós já estão organizados em cooperativas que vendem ecoturismo em trilhas florestais, mó­­veis e outros produtos de madeira feitos a partir de cortes seletivos sustentáveis, além de uma linha de bolsas bastante atraente feita de “couro ecológico”, também conhecido como borracha da floresta. Eles também recebem subsídios governamentais. Sérgio Pimentel, 48 anos, me explicou que costumava cultivar cerca de 2 hectares de terra para subsistência, mas agora está usando menos da metade de um hectare para sustentar sua família de seis pessoas. O restante da renda vem através dos negócios da cooperativa. “Nascemos nesta floresta”, acrescentou. “Então, sabemos a importância de sua preservação, mas precisamos ter um acesso melhor aos mercados globais para os produtos que criamos aqui. Você pode nos ajudar nisso?” Existem cooperativas como essa por todas as áreas protegidas da Floresta Amazônica. Porém, o sistema precisa de di­­nheiro – dinheiro para expandir para mais mercados, dinheiro para manter o monitoramento policial e o cumprimento das leis ambientais, e dinheiro para melhorar a produtividade da agricultura em áreas já degradadas, para que as pessoas não ocupem mais floresta. Qualquer que seja o projeto de lei de energia e clima aprovado no congresso americano, qualquer que seja o cenário resultante da conferência de Copenhague em dezembro – eles devem incluir recursos para financiar sistemas de conservação da floresta tropical como esses do Brasil. Os últimos 38% da Amazônia ainda estão disponíveis para quem pegar. Está lá, podemos salvar. Nossos netos vão agradecer.

Thomas Friedman é colunista do New York Times, vencedor de três prêmios Pulitzer.

Fonte: Gazeta do Povo

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